30 de novembro de 2010

Site Casa Fernando Pessoa




Os livros da Biblioteca Particular de Fernando Pessoa estão disponíveis

gratuitamente, online  no site da Casa Fernando Pessoa.



Até agora, só com uma visita à Casa Fernando Pessoa, em Lisboa, era possível

consultar este acervo que é riquíssimo. Com o site bilingue (português e

inglês) disponível, em qualquer lugar do mundo, com uma ligação à Internet,

é possível consultar, página a página, os cerca de 1140 volumes da

Biblioteca, mais as anotações – incluindo os poemas que Fernando Pessoa ia

fazendo nas páginas dos livros.



Casa Fernando Pessoa


Já fui lá....

20 de novembro de 2010

Literatura brasileira em preto e branco



Por: Paula Ivony Laranjeira

Embora o fim do tráfico negreiro tenha acontecido em 1850, a abolição em 1888, é somente a partir de 1920 que se trava com mais força, por parte dos afro-brasileiros, a luta por seus direitos e a busca por uma identidade racial em uma sociedade que “negava” a própria existência do preconceito, como bem lembra Jorge Schwartz em Vanguardas Latino-Americanas (EDUSP, 1995). A partir daí, o afro-descendente que se via como objeto assujeitado e quase sempre escravizado, agora tem uma literatura não apenas feita sobre si, ele toma a “pena” e se inscreve como sujeito e escreve para si partindo do seu ponto de vista, e não mais do colonizador. Tal mudança passa a vigorar não somente no Brasil, mas na literatura norte americana, na inglesa e, especialmente, nas produções africanas após o “fim” do colonialismo.
Em 9 de janeiro de 2003 entrou em vigor, a Lei Federal 10639/2003  que torna obrigatória a inclusão do estudo das “Relações Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana” nas escolas brasileiras. Com isso, há o “descobrimento” e a participação do negro em nossa sociedade. Desta data em diante, ele, o negro, passa a fazer parte da história e a ter uma história a ser repensada, além disso, se reconhece sua contribuição cultural e “até” seus talentos. Se antes ele era sujeito apenas nos campos de futebol e nas rodas de pagode, agora já “pode” ser um sujeito agente e atuante em vários setores da sociedade. Mas é como se a História vestisse nova roupa feita de tecidos rotos e velhos, e o mesmo que aconteceu no passado se repete, e ao invés de uma princesa-fada-madrinha que assina uma lei “dando” liberdade aos homens-escravos-negros brasileiros, no século XXI se fez através de uma lei discutida e votada por deputados magos-padrinhos que enfim dizem: “agora” vocês podem fazer parte da história, “agora” sua cultura, seus costumes, etc. podem ser partilhados.
O que a maioria desconhece é que desde o inicio do século XX os negros e negras deste país, em atos firmes na busca pela própria identidade, a qual foram destituídos ao passar simbolicamente  várias vezes ao redor da árvore do esquecimento, ainda em solo africano, e em seguida, ao atravessar o Atlântico. Porém, a alma negra acompanhou tais sujeitos nos porões dos navios negreiros, e depois de anos acorrentada nos troncos, se auto-proclama livre e ressurge como a fênix, inicialmente através dos movimentos abolicionistas e posteriormente com a Frente Negra Brasileira, com o MNU, com Geledés, o Quilombhoje, o Negrícia, Gens, entre outros movimentos. No entanto, esta era uma luta sem holofotes, sem a mídia, foi o combate “vencido” em gritos abafados, mas lembrem-se, jamais emudecidos.
E é justamente para esta “invisibilidade” que se voltará o olhar neste texto: àquilo que nos foi negado saber e conhecer, mais precisamente à produção literária em que o eu-enunciador negro aflora. Mas é nos autores surgidos a partir da década de 1960 que vamos nos ater, citando-os de forma superficial, só para dar ciência de sua existência e questionar a partir disso sua segregação.    
Ao observar a historiografia da literatura brasileira é possível encontrar autores negros e mulatos destituídos aparentemente de sua identidade, cujo representante mais citado é Machado de Assis, “acusado” de não levantar em seus textos a bandeira contra o preconceito, porém o que se observa é que em suas crônicas, ele lamenta a condição dos escravos, louva os que os libertam e critica os que apóiam o sistema; em alguns dos seus contos há uma postura afro-brasileira, como nos contos Pai contra mãe (1906) e O casa da vara (1899); além disso, em seus romances não aparece o olhar explorador, menos ainda o escravista.
Se temos autores polêmicos em seus discursos, temos também aqueles que tiveram seus discursos “silenciados” por assumirem abertamente na literatura a identidade negra, é o caso de Maria Firmina dos Reis, que em 1859 lança Úrsula, romance em que o negro aparece como sujeito e representante de valores morais; temos também Domingos Calda Barbosa (1738-1800), poeta e violeiro,  além de outros esquecidos e perdidos.
Em 1960, ano em que se inicia a comemoração ao dia da Consciência negra no 20 de novembro, nasce também o internacionalmente conhecido Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus, uma negra favelada que vende em uma semana mais de dez mil exemplares do seu primeiro livro, e na sequência lança Casa de alvenaria e Diário de Bitita. Outra autora com destaque internacional é Aline França, que já está na segunda edição na França com o livro A mulher de Aleduma. No grupo masculino destaca-se Joel Rufino dos Santos, que entre outras produções cita-se O dia em que o povo ganhou e Quatro dias de rebelião, tendo como objetivo reexaminar a posição do negro na história. Há também Romeu Crusoé que em 1951 publica A maldição de Canaã, raridade que constitui o primeiro romance negro da modernidade, além deste tem Filho nativo e negrinho e o inédito Crepúsculo noturno. Porém, este autor vive sozinho e esquecido no Rio de Janeiro.
Outros nomes representativos e atuantes na literatura afro-brasileira, e que vale citar são: Oswaldo de Camargo,  Conceição Evaristo, Oliveira Silveira, Geni Guimarães, Mirian Alves, Éle Semog, Cuti, Esmeralda Ribeiro, Marcio Barbosa, Sacolinha, Celinha (Célia Aparecida Pereira), Cristiane Sobral, Marise Tietra, Jônatas Conceição da Silva,  Adão Ventura, José Carlos Limeira, Elisa Lucinda e tantos outros que publicam desde 1978 nos Cadernos negros, sem contar aqueles que publicam de forma independente.
Depois de elencar tantos nomes que escrevem a partir de um eu-enunciador que se sabe negro e se quer negro, como bem lembra Zilá Bernd, vem a pergunta: Quais destes autores você conhece? Quais deles, depois da lei 10639/2003, estão citados nos livros didáticos? Vale salientar que em um país territorialmente grande, e com uma vasta produção literária como o Brasil, não se é obrigado a conhecer todos os escritores e suas obras. Mas não conhecer nenhum representante de uma literatura voltada a discutir e representar temáticas afro-descendentes é no mínimo, um convite a refletir sobre o espaço para tais autores nas grandes editoras, na mídia, nas escolas e nas universidades. 



Este texto também está disponível em Palavra Fiandeira 

15 de novembro de 2010

"Ars donum Dei est"


Por: Paula Ivony Laranjeira


No Tratado de pintura, Leonardo (apud DIAS DA CRUZ, p.51, 2010) conceitua a pintura "como uma 'poesia muda' que se dá no tempo e no espaço". Na sequência, José Maria Dias da Cruz, contribui para melhor entendimento da questão dizendo que diversas vezes Leonardo aconselha a observância aos mudos para escutar suas vozes, pois "os que não falam nos dizem muitas coisas através de seus olhos e gestos" (p. 51). 
Aqui deixamos o universo das palavras e adentramos o campo da comunicação em que a visão, gesto e expressões corporais transbordam em significados e significações. Ao estar diante de uma escultura, uma tela e/ou uma imagem, automaticamente somos postos diante de uma poesia concreta, muda em palavras, e prenha  de significados. Defronte de um conjunto de cores, imagens e símbolos, o apreciador num gesto de acolhimento pára imóvel, apenas escutando as vozes que ecoam da obra de arte. No caso da arte sacra, contemplando.
 
O trabalho de expressão sacra de Antonio Batista de Souza Junior ultrapassa esse olhar unilateral, pois não há apenas a escuta por parte do observador,  quem defronte ao objeto de arte se coloca,  está se dispondo a ser ouvido, a ser perscrutado. Assim, os objetos de sua pintura, o sagrado, além de inspirar contemplação, “também” contempla. A impressão é de que o divino, ali configurado, se põe em posição de escuta, lendo as expressões, os gestos, as lágrimas do humano-obra-de-arte. Assim, a escuta, no que se refere à arte sacra, se faz recíproca.
Conheci Antônio em 2002, mas ele, um jovem do oeste baiano era apenas o talentoso Junior, que pintava painéis, algumas telas, ornamentava  igrejas, ente outros. Através de amigos em comum fui acompanhando seu trabalho, e cada vez o admirando bem mais. Agora, o rapaz, além das telas, pinta capelas, igrejas e catedral. Trabalho este pode ser apreciado, em maior quantidade, no estado do Paraná, especialmente em Campo Mourão. Mas também pode ser visto em seu site Arte sacra ou em seu livro recém lançado, o Arte sacra.  

Seu trabalho iconográfico – inspiração bizantina – pode ser estranhado num primeiro momento, devido o traçado pouco comum no Ocidente, onde o artista pinta mediante a fé vivida, e sua experiência pessoal com o sagrado é retratada de forma espontânea, possibilitando uma liberdade de estilos no momento de retratar o divino. Já no Oriente, os artistas atem-se ao cânone estabelecido pela igreja, “seguindo os ensinamentos do Mestre Dionísio e, em geral, as determinações da Igreja, buscam reproduzir as mesmas passagens dos Evangelhos, omitindo qualquer experiência ou sentimento pessoal vivido, tratando simplesmente de uma profunda vida de oração, expressando-se no conteúdo dos Evangelhos”[*].
No livro, além das belas imagens, há toda uma preocupação em ligar e explicar a imagem de um ponto de vista teológico. Assim justificadas, se tornam ponte entre o invisível e o imaginado, ou elo indissociável entre a Terra e o Céu. Porém, as palavras são dispensáveis diante do belo e do divino contidos em cada imagem retratada, pois os significados perpassam a mudez inicial, se convertendo num evangelho feito de imagens, chegando até mesmo àqueles que ignoram os códigos linguísticos. Se Jesus no próprio evangelho diz que até “as pedras falarão” (Lc, 19:40) o que dizer de imagens onde o mistério divino e sagrado na fisionomia imaginada de Jesus se faz representado? 

Sobre o artista:






Antonio Batista de Souza Junior nasceu em 12 de julho de 1984 em Angical interior da Bahia. Desde criança vem desenvolvendo habilidades com desenhos. Aos 12 anos faz seu primeiro trabalho de pintura em tela, e seu acervo já ultrapassa as 250 telas em diversos tamanhos e estilos. Tem como preferência as pinturas de rostos em alta resolução, aproximando assim do mais fotográfico e real possível.
O trabalho em afrescos em Igrejas começou a ser aprimorado assim que o padre Sérgio Reis da Diocese de Barreiras-Bahia, o apresentou em 2004, o estilo iconográfico, por ocasião da entrada do artista Antônio Batista ao Seminário. Ao iniciar seus estudos filosóficos em Campo Mourão - PR, o artista teve um maior contato com a Arte Sacra, sua história e valores sacrais. 
 
Em meio aos seus estudos, propostas de pinturas surgiram e, em finais de semana, os painéis eram compostos. Atualmente, o artista dedica-se especialmente a Arte Sacra, e atua em todo o Brasil. Seu portfólio contempla mais de 30 trabalhos realizados em presbitérios e tetos de Igrejas e Capelas, sendo a maior parte delas, no Estado do Paraná. A Catedral de Campo Mourão – PR é a maior obra e até então, a mais significante, dando ao artista maior projeção. 
 
Pintando o teto da catedral

Mas como no trabalho de todo artista, um dos seus trabalhos causou grande polêmica: o painel de São José, que foi pintado com aspecto jovial. Segundo Antônio, o pintou assim por não encontrar registros bíblicos que indicasse ser José um homem de idade avançada. Sobre esta questão ele ainda faz outros acréscimos, justificando o uso de tal imagem na capa do livro.  
 
Catedral de Campo Mourão-PR

Veja também o site no qual expõe outros trabalhos:Telas 

Ao leitor menos avisado, chamo atenção para o fato desta que escreve, não ser perita em artes plásticas, por tal, o julgamento que faço é apenas o do olho que se encanta e da alma que se emociona. Não há o aprofundamento técnico, pois este não sou capaz de fazer.

[*]Trecho retirado e mais detalhes sobre Iconografia em: Ecclesia